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29 de março de 2024 4:33 AM

Coluna

Porandubas nº 750

Gaudêncio Torquato
Em 9 de março de 2022

 

Abro a coluna com o Mato Grosso do Sul.

Residência médica

Em Dourados/MS, foi eleito um prefeito semianalfabeto. Prometia na campanha: “prometo manter os postos de saúde abertos 24 horas, inclusive à noite”. Em outra ocasião, a UFGD (Universidade Federal da Grande Dourados) implantou o curso de medicina. Por conta das dificuldades de encontrar hospitais para a residência médica, travou-se grande discussão, na época da campanha, sobre a questão. Em um acirrado debate, perguntaram ao candidato como poderia contribuir para resolver o problema da residência médica. De pronto, respondeu:

– “Eu não pretendo dar casa para médico; eles já ganham muito e podem comprar casa. Só vou construir casa para pobre”.

(“Causo” enviado por Elizabeth Dias Rode)

Visão geral I

A par da vivência com a pandemia, o planeta se reparte em sentimentos sobre a guerra Rússia versus Ucrânia. Este país, administrado por um ex-comediante de TV, Volodymyr Zelensky, ganha a batalha da Opinião Pública, mas Vladimir Putin tende a impor sua força sobre um país que fez parte da União Soviética. Seu poderio bélico é algumas vezes superior ao da Ucrânia.

Visão geral II

O que pode se extrair de consequências para o cotidiano das pessoas, afinal, o que sobra do farto conjunto de informações, versões, interpretações, vieses que, todos os dias, leitores e ouvintes das mídias recebem? Entre dúvidas e certezas, o mais certo é por fé no dito de Fernando Pessoa: “noite e dia me trazem murmúrios novos. E dia e noite levam murmúrios velhos” ( Sonnet, Alexander Search, in O Livro das Citações, de José Paulo Cavalcanti Filho).

Velha clivagem

Em um primeiro momento, floresce o sentimento de que o planeta, a cada grande episódio – conflitos, guerras, pandemias, crise entre países – é jogado no terreno das antigas clivagens, com origem nas ideologias e doutrinas, a luta de classes, por exemplo. De fato, muitos dos torcedores dos lados da guerra Rússia x Ucrânia, ainda se respaldam no discurso da asfixia do imperialismo/burguesia capitalista, sob a égide do neoliberalismo, ante a vitória do proletariado. Uma luta que banirá todas as classes sociais. Em nossas plagas, torcidas ainda levantam essas bandeiras.

O outro lado

Na presente disputa de narrativas, há muitas denúncias contra a exuberante onda de apoios obtida pela Ucrânia, por meio de seu “estadista” Zelensky. Entre as denúncias, uma se apresenta sob o solene aviso: “você precisa ouvir o outro lado”. A respeito de minha coluna da semana passada, tentando descrever a índole de Vladimir Putin, recebi, até, um puxão de orelhas de um intelectual, amigo e presente na cena institucional do país, que registro: “Falta um parágrafo (nas suas análises): cada país, ao entrar na OTAN recebe uma base de foguetes nucleares americanos, Cruise e Persing II, apontados para a Rússia. A uma distância que, uma vez lançados, não dá para interceptar. Em 1962, os russos iam fazer o mesmo em Cuba. E a VI (frota) interceptou navios mercantes, com ordem para afundar, acaso não voltassem. E ninguém criticou. Fazia sentido. Faltou esse dado. Bastaria que os EUA retirassem os seus foguetes e não haveria invasão. Claro que isso não justifica. Mas faltou o outro lado”. Ao amigo, minha homenagem. O outro lado está exposto.

O desmantelamento cultural

Para um grande grupo de cientistas sociais, o que está ocorrendo no planeta é um processo de desmantelamento cultural, feito sob alguns fenômenos em curso – a personalização da política, os modelos e padrões desempenhados pelos governantes que influenciam imitações e usos do público, enfim, um processo de colonização que desmantela as estruturas e a cultura dos grupos. As normas de conduta se desvanecem. Os indivíduos já não sabem como pautar suas condutas. Emerge a crise dos costumes e das convicções, dando vazão ao conceito de Durkheim sobre anomia: o estado no qual as normas não existem.

A emergência do poder absoluto

Escreve o sociólogo Bertrand de Jouvenel: “os fenômenos de desarmonia social e moral favorecem o aparecimento do poder absoluto – incoerência social, condutas anti-harmônicas, más condutas, fenômenos de desnorteamento e desregramento. Homens desrraigados, recém chegados a uma nova condição, não encontram imagens de comportamentos que governem seu novo personagem”. Nessa moldura, transparece a figura do líder carismático, do líder autoritário, do mito, do “salvador da pátria”. Puxem a imagem e coloquem na cara de alguns líderes contemporâneos.

Além de murmúrios

Pois bem, além de murmúrios que vão e que vêm, que comportamentos poderão impregnar o espírito de nosso tempo face ao clima de ódio e medo que se instalou no leste europeu? Primeiro, o da resignação. Milhões de famílias se dobram ante a inevitabilidade das tensões que se multiplicam naquela região. Depois, a banalização do terror, marcada pelos canhões e mísseis mortíferos, que impermeabiliza a morte, de tão intensa e constante como se apresenta.

A polaridade

Sob esse zunido aterrador, emergem o ódio, a vontade de vingar o ente querido, as tensões, a polaridade. Daí o círculo de adoradores dos protagonistas, de um lado, e os adversários, de outro, a se fustigarem com expressões de ódio e a esquecerem as identidades de povos irmãos, muitos falando a mesma língua.

E o bom senso

O bom senso dá adeus às ilusões da paz e da harmonia, razão pela qual o planeta se encontra destrambelhado, abandonando as faculdades mentais de seus humanos habitantes. E isso, vale frisar, explica a necessidade de resgatarmos os valores do humanismo e da solidariedade, nos termos em que minha amiga de redes sociais, Marisa Cruz, defende. Sua preocupação é com a escalada de niilismo que assola a Humanidade, o que nos torna gente com DNA contaminado pela maldade e pela barbárie. Sinais de uma guerra nuclear estão nos ares e radares, bastando que um protagonista abilolado pressione o botão de destruição de seu arsenal nuclear.

Zelensky e Putin

O cenário é previsto: Vladimir Putin ganhará as batalhas, mas perderá a guerra, eis que o manto da autocracia que o cobre está sujo de sangue. O espaço sangrento que se abre para que ele caminhe em direção aos louros da vitória será alargado pela perspectiva de vir a aumentar o seu anseio por anexações de territórios ao mundo russo. E, para não esconder o outro lado, urge que os EUA e os países europeus que integram a OTAN se convençam de que precisam deixar de fazer ameaças a países que não fazem parte de seu grupamento. Se quisermos resgatar a paz no planeta, é hora de um desarme geral do espírito de ódio e conflito que paira sobre as Nações.

Flashes e pílulas

– Arthur do Val, o famoso Mamãe Falei, merece o repúdio dos seres humanos que respiram ares da ética e da moral. Sua expressão estapafúrdia sobre as mulheres “pobres” ucranianas é um acinte à Humanidade.

– O MBL está desgastado e pronto para se tornar um ente sem força e prestígio.

– Sergio Moro já esteve melhor. Será queimado por Mamãe Falei.

– O final do prazo para viabilização da Terceira Via é o mês de julho.

– Bolsonaro cresceu uns 4 a 5 pontos no último mês. Lula perdeu 8. Mas continua liderando bem.

– A campanha vai ao segundo turno. Anote.

– Na régua de 0 a 10, a possibilidade de protagonistas baixarem seus índices de rejeição aponta:

– acima de 60% de rejeição – nota 2

– acima de 50% de rejeição – nota 3

– acima de 30% de rejeição – nota 4

– em torno de 20% de rejeição – nota 5

– em torno de 10% de rejeição – nota 7

– Se Lula for ao segundo turno com um candidato da terceira via, será difícil levar a melhor.

– Se Bolsonaro for ao segundo turno com Lula, teria chances de ganhar, a depender do estado da economia.

– O futuro do bolsonarismo estará garantido pelas alas do conservadorismo e de segmentos do pequeno e médio empresariado, além de parcelas das margens.

– O país vive uma das maiores crises de lideranças de seus ciclos históricos. Quem são os protagonistas com um pé no amanhã?

– Parcela importante do eleitorado está se vacinando contra as fake news.

– A razão, mesmo perdendo bem para a emoção nesse momento obscuro, está subindo alguns degraus.

Fecho a coluna com pequeno roteiro de planejamento de campanha eleitoral.

Este consultor, ancorado em sua vivência, chama a atenção para o planejamento das campanhas, que abriga estas metas: 1) priorizar questões regionalizadas, localizadas, na esteira da micropolítica; 2) procurar cria um diferencial de imagem, elemento que será a espinha dorsal da candidatura, facilmente captável pelo sistema cognitivo do eleitor; 3) desenvolver uma agenda que seja capaz de proporcionar “onipresença” ao candidato (presença em todos os locais); 4) organizar uma agenda contemplando as áreas de maior densidade e, concentricamente, chegando às áreas de menor densidade eleitoral; 5) entender que eventos menores e multiplicados são mais decisivos que eventos gigantescos e escassos; 6) atentar para despojamento, simplicidade, agilidade, foco para o essencial, mobilidade, propostas fáceis de compreensão e factíveis.

Atualizado em: 9/3/2022 08:08

Epa! Vimos que você copiou o texto. Sem problemas, desde que cite o link: https://www.migalhas.com.br/coluna/porandubas-politicas/361025/porandubas-n-750

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