O ministro da Defesa, José Múcio, reconheceu que a escalada da crise entre Venezuela e Estados Unidos preocupa o Brasil, sobretudo por conta da fronteira em Roraima. Ainda assim, tentou suavizar a gravidade do cenário ao classificar o conflito como uma simples “briga de vizinho”. A fala, no entanto, contrasta com as movimentações das próprias Forças Armadas brasileiras, que já reforçaram tropas na região e programaram operações antes mesmo do aumento das tensões.
“Estamos preocupados, como eu disse, com a nossa fronteira, para que ela não sofra e não transforme a nossa fronteira numa trincheira. O Brasil é um país pacífico”, declarou Múcio nesta sexta-feira (5). Apesar do discurso de neutralidade, o envio de contingentes militares mostra que o Planalto não descarta riscos reais de impactos no território brasileiro.
O que está em jogo
A instabilidade se intensificou após os Estados Unidos deslocarem navios, submarinos e caças para a costa venezuelana, sob a justificativa de combater o narcotráfico. Washington acusa o governo de Nicolás Maduro de comandar um cartel internacional de drogas — narrativa que especialistas rejeitam como politicamente interessada. Maduro, por sua vez, denuncia que o verdadeiro objetivo é forçar uma “mudança de regime” num país que detém as maiores reservas de petróleo do planeta.
O Brasil, em conjunto com outros países da América Latina e Caribe, já manifestou preocupação com a presença militar norte-americana tão próxima de suas fronteiras. Ainda assim, o ministro brasileiro insiste em afirmar que as operações são apenas de “assistência” e não têm ligação direta com o impasse entre Caracas e Washington.
Entre discursos e trincheiras
Em dezembro de 2023, tropas brasileiras já haviam sido deslocadas para Roraima devido à disputa territorial entre Venezuela e Guiana, no Essequibo. Agora, diante da nova frente de atrito com os EUA, o governo tenta passar a ideia de que a presença militar é preventiva e não uma resposta direta à tensão.
“O Brasil é pacífico, nós não estamos de olho na terra de ninguém”, reiterou Múcio. No entanto, ao classificar a escalada militar como mera “briga de vizinho”, o ministro parece ignorar que um eventual confronto entre uma potência nuclear e um país vizinho pode arrastar toda a região para um cenário de instabilidade.
Crescente militarização
O Pentágono acusou a Venezuela, na última quinta-feira (4), de realizar voos militares hostis perto de um navio norte-americano em águas internacionais, classificando o ato como “provocador”. Pouco depois, a imprensa internacional revelou que os EUA enviaram dez caças F-35 para Porto Rico, ampliando sua presença militar no Caribe.
Maduro reagiu pedindo a redução imediata das tensões. “Os Estados Unidos devem abandonar seu plano de mudança violenta de regime e respeitar a soberania da Venezuela”, afirmou neste sábado (6).
O risco para o Brasil
O Planalto insiste em se posicionar como mediador neutro, mas a fronteira amazônica, já marcada por vulnerabilidades logísticas, tráfico e migração em massa, pode se transformar rapidamente em linha de impacto caso a crise escale. O discurso do ministro, que tenta simplificar a situação, contrasta com a realidade de uma região cada vez mais militarizada.
Em meio a navios, caças e submarinos, soa ingênuo reduzir o impasse a uma “briga de vizinho”. Para o Brasil, o risco é ver sua fronteira virar o quintal de uma guerra que não provocou, mas que pode atingir diretamente sua soberania.